terça-feira, 29 de junho de 2010

Drama de Existir

Você adentra incerta a sala, encarando com desconfiança todas aquelas pessoas sorridentes. Você tem que tirar seus sapatos e tem nojo de deixá-los junto com as havaianas e tênis fedidos e encardidos dos outros participantes, mas decidiu ser tolerante. Há vários tapetes no chão e tudo seria bem parecido com a sala da sua aula CP Training se na frente da sala, ao invés de uma parede de espelhos pra você poder admirar suas formas gostosas malhando, não tivesse um sofá com uma manta amarela, mesas com foto de um indiano sorridente, incensos e outras parafernálias hindus.
Você decide ouvir o que a brasileira fantasiada de deusa Shiva, que usa blush em só uma bochecha, tem a dizer, e manter a mente aberta.
Afinal, você pagou caro por esse curso de respiração que sua amiga insistiu tanto pra você se matricular. O mínimo que podia fazer era curtir a experiência.
Você praticou yoga, participou das dinâmicas, conheceu gente nova com filosofias novas, aprendeu sobre benefícios do vegetarianismo, se identificou em vários momentos e absorveu cada gota de coisa boa que podia da experiência. Além do mais, mesmo com sua veia palpitante por diversão, você tem um lado romântico, conservador e espiritual que seus amigos não entendem e que aquelas pessoas pareciam dispostas a aceitar.
E daí se você teve que passar todo o seu fim de semana lá e perder noitadas certamente memoráveis? E daí se os exercícios de respiração faziam seus pulmões arderem e te deixarem tonta? Você estava cuidando de sua espiritualidade certo?
Era o que você repetia para si mesma enquanto, com a testa encostada na janela do ônibus, via pessoas bonitas, bem-vestidas e deliciosamente bêbadas deslizando pela noite da Zona Sul do Rio enquanto, com roupas de malhar, seu cabelo preso no topo da cabeça e mantras tocando repetidamente na sua cabeça, você ia – er - meditar.
Então você foi forte. E até conseguiu curtir o curso, mesmo que se sentisse um pouco estranha. Afinal, todo dia as pessoas anunciavam o quanto o curso estava mudando suas vidas e o quanto haviam mudado para melhor e o quanto estavam se encontrando e tendo experiências extracorpóreas na hora das meditações. Você realmente estava se dedicando e tentando, mas não estava recebendo o mesmo chamado divino que os outros participantes pareciam estar recebendo.
No último dia, enquanto abraçava seus instrutores e prometia que iria voltar, (pedindo perdão a Deus, Lorde Ganesha e Hécate por mentir na cara dura dessa forma), alguém anuncia uma night depois do curso.
Com os ouvidos aguçados, sua mente ávida por se perder em bobeiras e seu corpo clamando por um pouco de diversão, você presta atenção enquanto o vegano gostoso fala no microfone:
-É uma rave na Barra. Começa às onze horas, vai ter muita música e coisas que vocês nunca experimentaram antes. – ele sorri sedutor e meus olhos brilham. Aaaantes de ele continuar: -Mantras remixados. Open bar de sucos de frutas cítricas. Vamos fazer uma yoga deliciosa e curtir bastante. Termina às duas da manhã. Quero ver todo mundo lá, hein?
A maioria aplaude, mas fico deliciada ao ver que algumas pessoas suspiram da mesma forma que eu. Clareio a garganta quietamente e elas olham pra mim.
-Pré na minha casa. – sussurro.
Então você sai de lá uma pessoa calma. Se sente mais espiritualizada, informada sobre o mundo ao seu redor e com seus horizontes maiores.
No encerramento do curso, você canta alto, ri, pula, brinca e sai distribuindo gracejos para todo mundo como se fossem todos amigos de infância e você tivesse achado naquela ramificação saudável de comunidade Hare Krishna a razão da sua vida.
Você realmente não se arrepende da experiência mesmo que tenha sido um tanto dolorosa. Você gosta de conhecer coisas novas. E se voltasse no tempo faria tudo de novo.
Você abraça sua amiga e agradece pela experiência.
Com a promessa silenciosa de nunca mais voltar.
P.S: Eu ainda preciso dizer que minha intenção não é ofender ninguém de nenhuma cultura e religião? Er. Que seja.

P.P.S: Quem se interessou: http://www.artedeviver.org.br/

rs